E Tudo o Vento Levou

O forte vento que se faz sentir lá fora serve de inspiração para uma colectânea de sequências cinematográficas onde o vento tem um papel importante. Neste dia de forte ventosidade, o Mixtape aconselha que fiquem sossegados no sofá em casa na companhia de um destes filmes, ou até uma maratona cinematográfica se são cinéfilos de núcleo duro.

 

Em criança, em dias de muito vento, adorava escapar-me para a varanda e aninhar-me no sofá que lá estava, envolta num longo cobertor só para ouvir o som do vento e senti-o no meu rosto. Era o meu prazer secreto, se os meus pais adivinhassem tal proeza, de certeza seria levada a puxão de orelhas para o interior da casa. Ainda hoje gosto de adormecer ao som de tempestade de vento que varre tudo no seu caminho. Mas nesta edição o vento é projectado em ecrã.

No cinema o vento é um agente de mudança simbólica ou emocional. Pode representar a passagem para outra dimensão ou estado ilusório, pode unir ou reconciliar os protagonistas ou ser simplesmente uma metáfora do estado de alma revolto. Também é um factor meteorológico muito usado nos filmes desastre e, com avanço dos efeitos visuais digitais, a tela de cinema detém a visualização privilegiada da força sibilante da Mãe Natureza.

American Beauty

 

Palavras ao vento: «That’s the day I realized that there was this entire life behind things, and this incredibly benevolent force that wanted me to know there was no reason to be afraid, ever.»

 No oscarizado American Beauty, o vento protagoniza o momento poético do filme, directamente saído da experiência de vida e exímia escrita de Alan Ball, o argumentista. Emociono-me sempre quando vejo esta cena pois também partilho a ideia que observar algo maravilhoso nem sempre cabe no coração.

The Wizard of Oz

 

Palavras ao Vento: «Toto, I don’t think we’re in Kansas anymore»

 No maravilhoso clássico dos anos 30, o forte vento na forma de tornado, transporta Dorothy da simples vida real de uma quinta do Kansas para um mundo de maravilhosa fantasia onde esta, mais três personagens caricaturadas, embargam numa aventura em busca do Feiticeiro que resolverá todos os problemas. Tal como em Alice no País das Maravilhas, o vento é como o espelho, um portal de entrada que não é mais que uma viagem de descoberta interior.

Wunthering Heights

Palavras ao vento: «I have not broken your heart – you have broken it; and in breaking it, you have broken mine.»

 Do antigo dialecto britânico, Wunthering é o adjectivo que descreve uma zona geográfica assomada por fortes e uivantes rajadas de vento. A autora Emily Brontë coloca os protagonistas de trágico amor nas charnecas do norte de Inglaterra, onde a condição meteorológica é inóspita, cruel e fustigante, como os seus protagonistas. Heathcliff e Catherine amam-se, mas não conseguem assumi-lo por defeito de carácter: o orgulho e a frivolidade. A adaptação cinematográfica de 1992 com Ralph Fiennes e Juiette Binoche é a minha favorita e a cena em que Heathcliff toma conhecimento da morte de Catherine, Fiennes exterioriza uma palete de emoções que vai da angústia, fúria e loucura com uma intensidade tão impressionante como o vento que sopra forte na charneca.

 E.T – Extra Terrestrial

Palavras ao vento: «Run for your life! Back to the river! Back to the forest»

 Numa das mais deliciosas cenas do filme E.T, o vento que de rompante entra dentro da sala de aula é figurativo de um estado sonho em que o pequeno Henry se encontra. A ligação emocional com o extra terrestre é evidenciada  quando E.T, que está em casa ébrio, assiste a uma cena romântica entre John Wayne e Maureen O’Hara no filme«The Quiet Man» e Elliot emita o gesto. Spielberg é brilhante ao filmar a sequência em pantomima evocada pelos filmes mudos, onde não faltou o levantar de calcanhar da menina arrebatada pelo beijo de Elliot.

The Neverending Story

Palavras ao vento:(the Nothing) «It’s the emptiness that’s left. It’s like a despair, destroying this world. And I have been trying to help it.»
A terra de Fantasia onde estão concentrados todos os sonhos e fantasias da humanidade, está a morrer pois os humanos perderam a fé nos sonhos. Esse nada que se instala dita o fim da terra de fantasia que se dissipa sob fortes ventos. Em Neverending Story, o vento é manifestação física de sonhos perdidos.

Twister

 

Palavras ao vento: « “The Suck Zone”. It’s the point basically when the twister… sucks you up. That’s not the technical term for it, obviously»

 No filme de Jan de Bont, os tornados são protagonistas meteorológicos, Twister segue uma inusitada equipa de profissionais que perseguem tornados para recolherem dados. Parece ficção mas não é, existem de facto corajosos insanos o suficiente para estar perto de tornados. Nem todos têm a «sorte» de ver o interior de um tornado em acção, excepto nós, os espectadores com a ajuda de muito convincentes efeitos visuais, no conforto e segurança da sala. é a magia do Cinema.

Bram Stoker’s Dracula

 

Palavras ao vento: «I have crossed oceans of time to find you»

 Na mais perfeita adaptação do clássico literário de Bram Stoker, Drácula é um conde romeno amaldiçoado por desafiar a lei cristã. Amargurado com a morte da sua mulher, Dracul torna-se um ser sobrenatural que suga o sangue para garantir a imortalidade. «Também eu sou capaz de amar»diz o monstro e, em busca da alma da sua mulher, reencarnada em Mina na distante Inglaterra, o conde percorre os mares dentro de um caixão. No filme, os fortes ventos estão directamente relacionados com a incarnação monstruosa de Drácula. Durante a viagem, fortes ventos assolam o navio que o transporta, ao encontro das suas vítimas, em particular Lucy, o forte vento é a interpretação de natureza obscura do homem em  forma de monstro. Já com Mina a seu lado, na corrida contra o nascer do sol, esta invoca a tempestade para escurecer os primeiros raios de luz.